PL quer barrar licença para megaobra na ilha de Boipeba

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Proposta legislativa de parlamentar estadual pretende derrubar a licença para o empreendimento Ponta dos Castelhanos, na ilha de Boipeba (BA). ONGs, população e pesquisadores criticam a autorização, pois prejudicaria a Mata Atlântica, a vida de populações tradicionais e o acesso público às praias.

Em 7 de março passado, o Inema (Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos) da Bahia autorizou a implantação do projeto turístico-imobiliário da Mangaba Cultivo de Coco.

Um esquema para o projeto foi traçado em 2009 por um escritório de arquitetura, de São Paulo (SP). Os diagramas apontam a provável distribuição dos lotes das 67 residências, 2 pousadas de 25 quartos, hotéis, pista de pouso, trilhas e estação de tratamento de resíduos, listados no licenciamento.

Provável distribuição do projeto Ponta dos Castelhanos no sul da ilha de Boipeba. Mapas: Reprodução / WWW

Para o deputado Hilton Coelho (PSOL), a licença submete o desenvolvimento socioeconômico da ilha a vultosos investimentos privados em detrimento da proteção da Mata Atlântica, da cultura e dos direitos de povos tradicionais. “A licença é um absurdo. Está afrontando tudo isso”, ressalta. 

Sua análise o fez registrar uma proposta na Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) para derrubar o aval do Executivo estadual ao projeto. O PSOL apoiou a eleição e compõe a base do governo Jerônimo Rodrigues (PT), mas com “independência política”, diz a assessoria de Coelho.

Ele fez um pronunciamento esta semana no plenário da Alba buscando apoio à aprovação de seu projeto de decreto legislativo. O texto foi pautado para debates nas comissões de Meio Ambiente e de Direitos Humanos da casa. 

O parlamentar lembra que a autorização em Boipeba não pode ser desconectada do acelerado processo de grilagem de terras públicas e de gentrificação no litoral baiano. A gentrificação ocorre quando estruturas e moradores locais são substituídos por outros, geralmente de maior renda.

“A Bahia está sendo esquadrinhada por turismo, agronegócio e mineração ligados a esquemas de grilagem, de pistolagem, dos ‘coronéis’ que historicamente se instalaram no estado e agora amplificam os interesses de grandes grupos econômicos, nacionais e estrangeiros”, afirma Coelho.

Representante dos moradores de Moreré e de Monte Alegre, praias em Boipeba, Bernardo Bramont avalia que, apesar de medidas amarradas no licenciamento e de promessas da empresa, não estão asseguradas a conservação da natureza e do modo de vida das populações tradicionais.

“Não tenho dúvidas de que, se o projeto continuar, os caminhos e práticas de comunidades como de quilombolas e de pescadores serão encurtados. Essas pessoas ajudaram a preservar a ilha, mas não terão mais a mesma liberdade que tiveram ao longo da história”, comenta o ativista.

A ilha de Boipeba está encaixada no litoral sul baiano. Mapa: Google Earth/O Eco

Maré enchendo

Em nota, o Observatório Socioterritorial do Baixo Sul da Bahia se diz perplexo com o aval ao empreendimento turístico-imobiliário, pois o mesmo violaria diretrizes e recomendações do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual das Ilhas de Tinharé e Boipeba.

“Trata-se, portanto, caso seja viabilizado, de um projeto que consolida os processos de privatização, degradação e captura de terras públicas da União, com consequências ambientais e sociais sem precedentes”, destaca a entidade, que reúne instituições públicas de ensino e de pesquisa.

Um dos abaixo assinados críticos ao projeto acumulava mais de 65 mil assinaturas no fechamento da reportagem. Um perfil no Instagram criado pelo movimento de proteção de Boipeba soma por volta de 14 mil seguidores. A ilha tem entre 4,5 mil e 5 mil moradores, estimam fontes locais.

Coordenadora da ong Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia, Txai Suruí lembrou, em sua coluna no jornal Folha de S. Paulo, da situação de Boipeba ao criticar a ocupação desenfreada das praias brasileiras. 

Para ela, a “praia não deveria ter classe social, o dinheiro não deveria importar. O mar está aí para todo mundo se banhar. E quem nasceu lá, como indígenas e caiçaras, está sendo expulso, impedido de pescar, de nadar e de estar em seus territórios ancestrais”.

A ativista avalia que a privatização litorânea irá disparar no país caso o Congresso aprove a extinção dos terrenos de marinha e a criação de zonas especiais de turismo na beira do mar, rios e lagoas. Isso “promoverá a destruição ambiental e a insegurança climática”, alerta.

No mesmo jornal, o colunista Guilherme Dias destaca que o projeto em Boipeba agravará o racismo ambiental, “uma vez que os impactos negativos não seriam sentidos por quem chega de helicóptero na ilha, mas pela população historicamente marginalizada e invisibilizada, em sua maioria, negra”.

Parte da Área de Proteção Ambiental (APA) Estadual das Ilhas de Tinharé e Boipeba, no litoral baiano. Foto: Rafael Watanabe/Creative Commons

Público e privado

O Inema da Bahia e a Mangaba Cultivo de Coco não concederam entrevista e nem enviaram informações (abaixo) até o fechamento da reportagem. Todavia, publicaram notas nos últimos dias minimizando impactos do empreendimento e contestando informações divulgadas sobre o mesmo. 

O órgão ambiental público baiano afirma que o licenciamento seguiu todos os trâmites legais, que as terras do projeto tem escrituras registradas em cartório, que o mesmo trará “ganhos e infraestrutura para a comunidade nativa” e que foi autorizada a supressão de 2,9 hectares de vegetação nativa. 

O governador Jerônimo Rodrigues (PT) disse esta semana que pedirá informações à Secretaria de Meio Ambiente para verificar se “há algo ilegal” na iniciativa. Desde já, declarou que a mesma “está dentro do padrão” e que o Estado exigirá da empresa uma “compensação”, traz o Informe Baiano.

Já uma nota da Mangaba Cultivo de Coco contesta impactos do projeto à Mata Atlântica e povoados tradicionais e a ocupação de 20% da ilha de Boipeba. “Tais declarações não são compatíveis com a verdade, e deixam claro o  desconhecimento de seus autores e disseminadores”, diz a empresa.

“A autorização e a licença concedidas pelo Inema são, por si só, evidências de uma iniciativa que tem como premissa, atender à legislação vigente e estar de acordo com condicionantes que resguardam a região do município de Cairu para as futuras gerações”, destaca o publicado.

A licença do Inema e os diagramas do projeto obtidos por ((o))eco apontam que o imóvel tem 1.651 hectares em Boipeba, ou exatos 18,75% da ilha, que tem 8.800 ha. A ocupação, todavia, não se traduz em desmate de toda a área.

Ao mesmo tempo, as fontes ouvidas por ((o))eco destacam que mais permissões para desmate podem ser emitidas pelo Inema e que o bioma Mata Atlântica não é só “mata”, igualmente abarca praias, dunas, campos, restingas, mangues e outras formações naturais.

“Na área do projeto há desova de tartarugas, alguns dos animais que podem ser prejudicados pelas obras, iluminação, movimentação de pessoas e de barcos e do empreendimento. Isso deveria pesar nos estudos, laudos de impactos e licenciamento do projeto”, lembra Bernardo Bramont.

Questões não respondidas a ((o))eco por Inema e Mangaba Cultivo de Coco sobre o projeto Ponta dos Castelhanos

  • Onde estão e qual o tipo de flora e de fauna que ocorrem onde o corte de 2,9 ha de vegetação nativa foi autorizado?
  • Novas permissões para o corte de vegetação natural poderão ser autorizadas?
  • Todas as estruturas listadas na licença serão implantadas sobre qual tipo de vegetação e/ou terreno? 
  • Não há entraves para licenciar um empreendimento turístico-imobiliário a uma empresa cujas atividades registradas na Receita Federal são “Cultivo de coco-da-baía” e “Cultivo de frutas de lavoura permanente não especificadas anteriormente”?
  • O empreendimento será cercado, murado ou receberá estrutura similar? Quilombolas, pescadores e outros moradores tradicionais terão acesso às praias?
  • Caso o projeto não avance, a região pode sofrer uma ocupação intensa e similar às de Morro de São Paulo ou Velha Boipeba, como afirmado?

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