Um refúgio de árvores ameaçadas nas montanhas de São Paulo

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Ao longo dos séculos de exploração, a Mata Atlântica no estado de São Paulo – hoje reduzida a um terço da sua cobertura original – encontrou refúgio nas montanhas. Locais como a Serra do Mar e a Serra da Paranapiacaba, onde manchas maduras e bem preservadas de floresta conseguiram sobreviver. A maioria delas sob o manto protetor de uma unidade de conservação. Um levantamento da flora no Parque Estadual Nascentes do Paranapanema revela alguns desses tesouros cada vez mais raros. De acordo com a pesquisa, existem 204 espécies de árvores no parque, sendo 21 delas ameaçadas de extinção, entre elas uma espécie que já era classificada como extinta no estado.

O parque estadual está localizado na Serra da Paranapiacaba, um dos maiores remanescentes de Mata Atlântica do estado, protegido atualmente por um mosaico de unidades de conservação. A região virou um verdadeiro porto seguro para espécies ameaçadas. A cada 10 espécies de árvores no parque, uma está sob risco de desaparecer, de acordo com o levantamento, publicado na edição de junho da Revista do Instituto Florestal.

Das 204 espécies arbóreo-arbustivas identificadas, 21 estão ameaçadas de extinção em nível estadual, nacional ou global. O estudo, assinado por dez autores, foi realizado em janeiro de 2012 justamente para embasar a proposta da área protegida, criada em junho do mesmo ano.

“Essa quantidade alta de espécies ameaçadas é porque o ambiente tem uma qualidade muito boa. Nas outras florestas mais alteradas você não encontra essas espécies mais rigorosas. Você encontra mais espécies generalistas, de ampla distribuição. Por isso você encontra [no parque] tantas espécies que em outros lugares já desapareceram e por isso estão ameaçadas”, destaca Frederico Arzolla, pesquisador científico do Instituto de Pesquisas Ambientais do Estado de São Paulo e um dos autores do levantamento.

A lista inclui as árvores Plinia silvestris e Roupala sculpta, ambas endêmicas da Mata Atlântica e classificadas como Em Perigo na Lista Vermelha global da IUCN. E a também ameaçada canela-sassafrás (Ocotea odorifera), muito explorada para extração do óleo e madeira. 

O parque protege ambientes de floresta montana, ecossistema pouco protegido no estado. Foto: Frederico Arzolla

Uma árvore sobrevivente

Entre as espécies ameaçadas, está uma árvore sobrevivente, já classificada como extinta em São Paulo. Trata-se do carvalho-brasileiro, também conhecido como carvalho-da-serra (Euplassa cantareirae). Com um um tronco reto acinzentado, uma copa larga e flores amarelas, a árvore pode chegar a 30 metros de altura. Achá-la, entretanto, nunca foi fácil. “É uma espécie muito exigente, que vai ocorrer apenas em locais com grau de conservação muito bom. E ela não é abundante, é difícil ver nas florestas”, explica Frederico.

Entre as exigências do carvalho-brasileiro está a sombra das outras árvores da floresta. “É uma espécie tardia, que cresce na sombra das outras e depois alcança o dossel”, conta o pesquisador. 

O carvalho possui uma distribuição restrita aos estados de Santa Catarina, Paraná e São Paulo, em altitudes que vão até 1.500 metros.

Como tratava-se de um levantamento florístico, os pesquisadores não investigaram mais informações sobre a população da espécie no parque. “Ela estava lá, mas não sabemos em qual quantidade”, conta Frederico.

As folhas do carvalho-brasileiro (Euclassa cantareirae), árvore ameaçada considerada extinta em São Paulo. Foto: Rafaela Valeck

Na avaliação nacional, a espécie é considerada Em Perigo. Já na última lista estadual de espécies da flora ameaçada de extinção no estado de São Paulo, publicada em 2016, é classificada como Extinta. “Essa classificação precisa ser reavaliada e alterada. Essa espécie não está extinta em São Paulo”, pontua Frederico. 

De acordo com ele, também há carvalhos-brasileiros na Serra da Cantareira, o local onde a espécie foi inicialmente descrita no século 20, atualmente um parque estadual em plena região metropolitana de São Paulo. 

“O histórico de conservação da Serra da Cantareira começa no século 19. Embora seja uma área que já foi desmatada, em 1895 foi criado o horto botânico, então a gente tem pelo menos 130 anos de conservação. E a Cantareira tem manchas de floresta com mais de 200 anos, que já eram florestas na época da criação da reserva, normalmente nas áreas mais altas, que ficaram mais protegidas. Por isso a gente encontra essas populações [de carvalho] por lá”, explica. 

Os refúgios da Serra da Paranapiacaba

O Parque Estadual Nascentes do Paranapanema ajuda a criar um corredor ecológico entre outros três parques estaduais: de Intervales, Carlos Botelho, Turístico do Alto Ribeira; e a Estação Ecológica de Xitué. Somadas, as áreas abarcam um território de mais de 148 mil hectares sob proteção integral. Este mosaico garante a proteção de um dos maiores remanescentes de Mata Atlântica de São Paulo, lar de espécies como a onça-pintada (Panthera onca), o muriqui-do-sul (Brachyteles arachnoides) e a maria-leque-do-sudeste (Onychorhynchus swainsoni).

Além disso, protege um conjunto de nascentes que compõe as cabeceiras do Rio Paranapanema, um dos principais rios do Estado em termos de geração de energia e abastecimento.

“O parque amplia o contínuo de florestas que existe na Serra da Paranapiacaba e amplia as áreas protegidas. Isso é muito importante quando você pensa em termos de futuro porque garante a proteção de um território para fauna e flora. E com populações viáveis. É uma perspectiva de longo prazo, é essa área contínua que garante a conservação da biodiversidade. São remanescentes de floresta madura em excelente estado de conservação e que inclui ecossistemas pouco protegidos no estado de São Paulo, como as florestas de altitude e florestas altomontanas”, avalia Frederico.

O parque possui 22,2 mil hectares. De acordo com o levantamento, quase 80% desse território são florestas em bom estado de conservação, sendo 15% (o equivalente a cerca de 3,4 mil hectares) ambientes de floresta montana e altomontana, ecossistemas pouco protegidos no estado. 

Ele destaca ainda a necessidade de novas pesquisas na área. “Não havia estudos antes do nosso, em 2012, para embasar a criação do parque, e não houve nenhum depois. É uma área de extrema importância para a biodiversidade e que está toda para ser estudada ainda”, reforça o pesquisador do Instituto Florestal.


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