[ad_1]
O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou, por unanimidade, na noite da última sexta-feira (19), ser inconstitucional a redução da participação da sociedade civil no Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), ocorrida em 2019.
A ação analisada pelo STF é sobre um decreto do então presidente Jair Bolsonaro (PL), que reduziu a composição do Conama de 96 para 23 conselheiros, sendo apenas 4 cadeiras para a sociedade civil. Na formação anterior, eram 22 representantes.
O decreto de Bolsonaro foi revogado por Lula no início deste ano, e a composição original do Conama parcialmente restabelecida.
Apesar da revogação, a relatora da ação no STF, ministra Rosa Weber, decidiu concluir a análise do caso, porque, segundo ela, “revela questão de absoluta essencialidade, a exigir o pronunciamento do Supremo Tribunal Federal, para proporcionar a fixação de interpretação, com eficácia erga omnes e efeito vinculante, que forneça adequado direcionamento, aos demais Poderes da República, quanto à composição de órgãos deliberativos de caráter decisório”.
Os termos jurídicos “erga omnes” e “efeito vinculante”, usados por Weber em seu voto, significam que a atual decisão do STF sobre a formação de colegiados ambientais no âmbito público tem repercussão geral daqui por diante.
Segundo a relatora, sem órgãos colegiados, a Administração Pública passa a ter perfil “concentrado e autoritário”, o que seria incompatível com o regime democrático.
“A governança ambiental exercida pelo CONAMA deve ser a expressão da democracia enquanto método de processamento dos conflitos. A sua composição e estrutura hão de refletir a interação e arranjo dos diferentes setores sociais e governamentais. Para tanto, necessária uma organização procedimental que potencialize a participação marcada pela pluralidade e pela igualdade política, bem como a real capacidade de influência dos seus decisores ou votantes”, afirmou.
Paridade entre os membros
Um dos pontos principais do posicionamento de Rosa Weber foi a defesa da paridade entre os membros do Conselho. Em seu voto, seguido pelos demais ministros do Supremo, Weber defendeu que “a participação popular nas estruturas decisórias governamentais deve obedecer ao critério da paridade”. “ A democracia paritária é condição lógica dos imperativos da democracia direta e da igualdade política”, disse.
Segundo a especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima, Suely Araújo, ainda que o voto de Weber não fale em “obrigatoriedade” na paridade, a decisão é um grande passo rumo e esse desfecho. “A decisão do STF é muito bem vinda, pois coloca freios no impulso antidemocrático de qualquer governo de ocasião que queira excluir a sociedade civil e representantes de demais esferas federativas do processo decisório. Da mesma forma, reforça a importância da paridade e de um necessário equilíbrio na representação social, seja no Conama, seja em outros conselhos, ressaltando a relevância do caráter inclusivo para a efetivação de políticas públicas, da escuta mais ampla possível da sociedade”, disse ela.
As discussões sobre a paridade na representação do Conama não são novas e vêm bem antes das mudanças radicais introduzidas por Bolsonaro em 2019. Isso porque, desde que foi criado, no início da década de 1990, até a mudança trazida na gestão federal anterior, o Conselho sempre contou com baixa representatividade dos diferentes setores da sociedade civil.
Segundo levantamento realizado pelo Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), na formação original (Decreto 99.274/1990-2019), membros dos governos Federal, Estaduais e Municipais ocupavam 67% das cadeiras (63 membros), sendo outros 9% (oito membros) para o setor econômico e apenas 18% da sociedade civil (17 membros). O restante das cadeiras estava nas mãos de indicações de governo e plenário ou não tinha direito a voto.
Com as mudanças trazidas por Bolsonaro, em maio de 2019 – Decreto 9.806/2019 – agora julgado inconstitucional pelo Supremo –, a participação social foi reduzida em número e proporcionalidade. Os governos ficaram com 74% das cadeiras (17 membros), o setor econômico com 9% (dois membros) e a sociedade civil, 17% (4 membros).
Com a volta de Lula ao poder, parte desse quadro de participação foi retomado. O Decreto 11.417/2023 aumentou o número de membros no Conselho, mas sua proporcionalidade, não. Dos 113 conselheiros, 71% (78 membros) são representantes de governos, 7% (oito membros), do setor econômico e 17% (18 membros) da sociedade civil. O restante é indicação do governo e plenário ou não tem direito a voto.
Além disso, Carlos Bocuhy, presidente do Proam, explica que, nos anos imediatamente anteriores a Bolsonaro, o descompasso entre as decisões do governo e a vontade da sociedade civil já se tornava evidente.
“Nos últimos anos aconteceu um esgotamento de diálogo entre a sociedade civil e as forças de governo. E o que que foi a gota d’água foi a resolução sobre os padrões de qualidade do ar aprovada em 2018, considerada [pela sociedade civil] de proteção insuficiente. Posteriormente ela foi judicializada e o STF já determinou que o Conama revisasse a norma. Esse foi o ‘pomo da discórdia’ lá atrás, que levou a um pedido de paridade”, explicou Bocuhy.
Sociedade civil já mobilizada
Desde a decisão do STF pela paridade entre os membros do Conama – e também sobre seus procedimentos de eleição, outro ponto tratado por Weber – a sociedade civil organizada começou a se manifestar em favor do cumprimento da decisão do Supremo.
Durante o final de semana, circulou um requerimento dos conselheiros do Conama pedindo a formação de um “Grupo Assessor” para elaborar proposta de reestruturação do Conselho, que contemplaria não só a composição do plenário, de forma a garantir a paridade, mas também o redesenho de Câmaras Técnicas e a revisão detalhada do regimento interno “à luz da proposta de nova composição paritária”.
Nesta segunda-feira (22), um manifesto assinado por 124 pessoas e organizações da área ambiental brasileira foi enviado ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), solicitando que, à luz da recente decisão do STF, o decreto de Lula sobre o Conama – o de fevereiro de 2023 – seja revisto.
“[…] As entidades signatárias solicitam do Governo Federal a revisão do Decreto 11.417 de 16 de fevereiro de 2023, de modo a garantir paridade entre as representações de sociedade civil e governo, na perspectiva de que o primeiro e o segundo setor (setores de governo e econômicos) ocupem, em comparação com terceiro setor, um número de assentos em condições de igualdade, cabendo, em caso de possível empate, a decisão que contemple os setores do terceiro setor”, diz o documento.
*Linha fina modificada às 19h34, de forma a expressar o correto entendimento dos desdobramentos da decisão do STF.
[ad_2]
Acesse o link