Deficiências do INCRA colocam em xeque programa de titulação no Brasil

[ad_1]

Altamira, no Pará, é o maior município do país. Ele tem quase 160 mil km² de extensão, o equivalente aos territórios de Portugal e Irlanda somados. E a complexidade de sua malha fundiária é proporcional ao seu tamanho. Dentro de seu território estão grandes unidades de conservação, terras indígenas, assentamentos rurais e terras não destinadas da União.

Para tentar resolver parte da questão fundiária em seu território, Altamira aderiu, em abril de 2021, ao programa federal chamado “Titula Brasil”, que passou aos municípios parte dos processos de titulação das terras públicas federais. 

Segundo levantamento ainda inédito do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), 196 municípios do país aderiram ao programa, lançado em 2020 pelo governo Bolsonaro e que ainda continua em vigor.

Foto: Jaime Souzza

Problemas estruturais no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), responsável pela finalização do processo de titulação, no entanto, tem comprometido o sucesso da iniciativa. Menos de ⅓ dos processos analisados pelo município foram concluídos pelo órgão de terras do governo federal.

((o))eco esteve em Altamira em agosto de 2023 e conversou sobre o andamento do programa com o prefeito da cidade, Claudomiro Gomes da Silva (PSD), e com o secretário de Regulação Urbana, Gustavo Mafra. Você confere os principais trechos da entrevista a seguir:


Por que o município de Altamira resolveu aderir ao programa?

Claudomiro Gomes da Silva – A falta de regularização fundiária é um grande problema de Altamira e de todos os municípios da Transamazônica. Quando da colonização da Transamazônica, no início da década de 1970, o governo trouxe pessoas para cá de todos os estados do Brasil e naquela época ele assentou essas famílias e existia apenas uma recomendação de que 50% do lote tinha que ser desmatado. Fora isso, naquela época não se deu título, não se delimitou as áreas que deveriam ser áreas de preservação. Veja que loucura. Eu costumo dizer que, comparando com uma luta de MMA, é como se o governo tivesse jogado todo mundo no ringue e tivesse só assistindo. 

Na verdade, é como a gente se sente até hoje. Porque daí surgiram os conflitos agrários, muita gente morreu. […] A gente aderiu ao programa do Titula Brasil com o objetivo de tentar resolver aquilo que o INCRA sempre colocou como um óbice, que é o fato de não ter pessoal para fazer o trabalho do campo, para revisar, para topografia. Então a gente se dispôs nesse convênio a fazer esse trabalho e entregar para o INCRA todo o trabalho de campo feito para que eles apenas emitam o título. 

Só que assim, criamos uma estrutura, uma estrutura considerável, mas não tem andado tanto porque o INCRA, de fato, além de ser muito, muito travado, é um órgão que, por não cumprir sua função, não atende hoje a demanda da população.

O que poderia melhorar seria a celeridade da análise dessas demandas que são repassadas do Núcleo ao INCRA

Gustavo Mafra
Como são os trabalhos da parte do município? Pelas normas do programa, o próximo passo, após a adesão, seria a implantação de um núcleo de trabalho municipal. Esse núcleo foi implantado? Quantos funcionários fazem parte do núcleo? São todos servidores de carreira?

Gustavo Mafra – Após a adesão ao Programa, foi instaurado o Núcleo Municipal de Regularização Fundiária, em maio de 2021, com sede na Secretaria de Agricultura, e que contava com a participação de cinco servidores públicos. Atualmente, o núcleo encontra-se em funcionamento na sede da Secretaria Municipal de Regulação Urbana e é composto por oito servidores públicos, sendo eles três de carreira.

O programa também previa o fornecimento, por parte do governo federal, de capacitação técnica aos servidores do núcleo municipal. Essa capacitação técnica foi feita? Quantas horas de treinamento foram fornecidas?

Gustavo Mafra – Sim, a capacitação do programa Titula Brasil foi realizada em dois momentos, sendo o primeiro treinamento realizado online, através da plataforma da Escola Nacional de Gestão Agropecuária (ENAGRO), onde foi ofertado os cursos de Regularização Fundiária e Assentamentos de Reforma Agrária e de Regularização Fundiária em Glebas Públicas Federais, com carga horária de 80 horas. O segundo momento de capacitação ocorreu no município de Santarém (PA), em agosto de 2021, na sede da superintendência do INCRA no Oeste do Pará, onde os servidores do número de Altamira participaram de palestras com servidores do órgão, vistoria em assentamentos e supervisão ocupacional em projetos de assentamentos naquele município, totalizando 50 horas de treinamento.

Atualmente existem oito servidores na secretaria, quantos carros têm para fazer as visitas de campo? 

Claudomiro As visitas de campo, quando a gente necessita fazer, nessa primeira etapa, a gente precisa da validação do servidor do INCRA para acompanhar a nossa equipe. Mas a partir de um segundo momento, o INCRA deveria também fornecer esses veículos para o núcleo de regularização, mas até hoje também não chegou.

E quantos carros o INCRA tem?

Claudomiro Eles receberam novos veículos e surgiu até uma possibilidade de doação dos veículos antigos para o município, para a secretaria em si, mas aí com a mudança do governo, tudo isso foi paralisado. Mas o que acontece é que quando o carro [do INCRA] está funcionando, eles não têm o combustível, é mais ou menos assim. 

Quais os resultados do convênio até agora? Quantos processos de regularização que vocês iniciaram e estão parados lá no INCRA?

Gustavo Mafra – O núcleo de Altamira atende 8 projetos de Assentamentos e 9 Glebas Federais. Até o momento, foram 256 processos de regularização analisados, 56 Certidões de Reconhecimento de Ocupação Entregues, 64 Títulos de Domínio entregues a proprietários de imóveis em Glebas Federais e 13 títulos de Domínio entregues para beneficiários da Reforma Agrária.

INCRA precisa resolver a parte dele. Porque no caso de Altamira, a gente está fazendo 70% do trabalho e só depende deles assinarem o documento, realizarem o processo e dar o título.

Claudomiro Gomes da Silva

Vale ressaltar que, por ser um acordo de cooperação técnica entre INCRA e Prefeitura de Altamira, os trabalhos de instrução processual, vistoria e coleta de documentos são realizados pelo Núcleo [municipal]. Ou seja, quase 70% do processo, mas a decisão final fica a cargo do INCRA. 

Não é possível mensurar com exatidão o número de imóveis que ainda necessitam de regularização, pois alguns assentamentos em Altamira ainda estão na fase de georreferenciamento, que é a etapa inicial para a regularização e é realizada pelo INCRA.

Vocês estão me dizendo que desse universo de 256 processos analisados, somente 56 títulos foram entregues para ocupantes de glebas federais e 13 títulos a beneficiários de Reforma Agrária, isso?

Claudomiro Apenas 13…[…] Agora, eu não advogo aqui que o poder de dar o título venha para a mão do município. Não acho que seja um bom caminho. Mas o INCRA precisa resolver a parte dele. Porque no caso de Altamira, a gente está fazendo 70% do trabalho e só depende deles assinarem o documento, realizarem o processo e dar o título. Isso não está acontecendo. 

O que vocês gostariam que melhorasse dentro do escopo do programa Titula Brasil?

Gustavo Mafra – O que poderia melhorar seria a celeridade da análise dessas demandas que são repassadas do Núcleo ao INCRA, deferindo os pedidos de assentamento e efetivando assim a regularização dos imóveis.


[ad_2]
Acesse o link

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *